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Relembre: Xadrez da venda da refinaria e os negócios dos Bolsonaro com os árabes


A compra da refinaria mostrou ao príncipe a extrema facilidade com que se fazem negócios no país. Basta se aproximar de pessoas espertas, e contar com a ignorância institucional brasileira

Publicado: 05/01/2024

Do GGN

Por Luís Nassif

Movimento 1 – o país da ignorância institucionalizada

Como se monta um bom negócio no Brasil, confiando nos seus bons contatos no governo? Aqui vai uma receita simples, em dois movimentos.

O primeiro, é como se valer da enorme ignorância institucional que campeia no país. O segundo, como montar um grupo de amigos para levar o negócio.

Passo 1 – a ignorância institucional

Há uma enorme dificuldade em identificar as grandes jogadas públicas no país, devido à ignorância institucional que campeia por todos os poderes. É uma ignorância sólida, inamovível como um bloco de concreto, que paralisa todos os setores institucionais: Supremo, Congresso, mídia.

Cria-se uma onda – no caso, o neoliberalismo radical – e, a partir daí, os votos do Supremo e reportagens da mídia seguem a onda, sem discutir nuances, detalhes, circunstâncias, mecanicamente tal qual uma votação da Lava Jato. A superficialidade suprema é tanta que tratam até a homeschooling – uma aberração proposta pela ultradireita – como pedagogia libertária.

Três ministros deram um by-pass na Constituição, ao deliberar que estatais não podiam ser vendidas sem aprovação do Congresso, mas suas subsidiárias sim: Luis Roberto Barroso, Carmen Lùcia e Alexandre de Moraes.

Ora, uma empresa é a soma das subsidiárias que a compõem. No caso do petróleo, a prospecção, o refino e a distribuição. Pela interpretação do STF, poderiam ser vendidos individualmente a prospecção, o refino e a distribuição, desde que mantivessem uma salinha com uma placa, indicando que era o que restou da Petrobras.

No STF, Carmen Lúcia endossou a interpretação canhestra de que subsidiárias poderiam ser vendidas sem passar pela Câmara. E passou ao largo do modelo de venda. Os dois outros Ministros que sancionaram a venda – Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes – sustentaram que bastaria um referencial de preços do Tribunal de Contas da União.

A refinaria foi vendida por US $1,6 bilhão.

A história a seguir mostra a quantidade de gols que o Supremo toma, devido à ampla desinformação sobre aspectos básicos da economia e dos negócios.

Peça 2 – o preço da refinaria

Antes da venda, a Petrobrás chegou a avaliar a refinaria em US$ 3 bilhões, mesmo valor a que chegou o INEEP (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis). Em fevereiro, a XP estimou o valor em US $3,5 bilhões e o BTG avaliou em US $2,5 bilhões.

Multiplicaram-se os alertas sobre as consequências da venda.

Pesquisador do INEEP, Eduardo Costa Pinto alertou que, com a venda, o monopólio estatal poderia se transformar em monopólio privado regional e poderia ocorrer apagão de combustíveis, já que a Petrobras deixaria de responder pela coordenação do abastecimento.

Coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar previu aumento imediato dos combustíveis. Como terá o controle de um monopólio regional, tratará de aumentar seus preços para melhorar o retorno.

Peça 3 – consequência imediata

Desde o primeiro dia da privatização, a refinaria interrompeu a venda de óleo bunker, destinado ao abastecimento de navios de largo porte, para navegação de cabotagem. Segundo levantamento do portal Poder360, cerca de 60 navios acessam o terminal mensalmente.

O Sindinave (Sindicato das Agências de Navegação do Estado da Bahia foi atrás da Petrobras, que não soube o que responder. Enviou ofício à ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) e não obteve resposta.

O jornal procurou todos os órgãos responsáveis pelo setor:

A Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) disse que a responsabilidade do caso é da ANP.

ANP -“está avaliando todas as informações e continua a monitorar o assunto de perto“.

CADE – não respondeu.

Na 4ª feira, a Acelen (novo nome da refinaria)  declarou que não irá seguir a política de preços da Petrobras – que anunciou redução de 3,1% nos preços dos combustíveis.

Enviou um comunicado seco às distribuidoras informando o seguinte:

“A redução anunciada pela Petrobras só será praticada nas refinarias que ainda estão sob sua gestão. Como a refinaria baiana foi privatizada, não mais pertencendo à estatal federal, a política de preço da Refinaria Mataripe será independente, uma das consequências da privatização da RLAM“, disse o sindicato, em nota.

Ou seja, todas as previsões pessimistas foram confirmadas no primeiro dia de privatização. Antes, levava alguns meses ou anos para que promessas vãs fossem desmentidas pelos fatos. No caso da refinaria, foi em um dia.

Peça 4 – as instituições entre a ignorância e a malícia

Millor Fernandes tinha um dito definitivo sobre situações assim: “Entre um burro e um canalha, não passa o fio de uma navalha”.

Tiremos o burro e o canalha, que são adjetivos muito fortes, para analisar a privatização da refinaria Landulpho Alves, na Bahia, e fiquemos com a ignorância, a irresponsabilidade e a malícia.

Para o Supremo Tribunal Federal (STF) cabem os dois primeiros adjetivos: ignorância e irresponsabilidade.

Esses senhores são os responsáveis pela venda e, agora, pelos problemas enfrentados pela navegação de cabotagem no Brasil.

Os Ministros do Supremo pelo misto de ignorância com onipotência. Fossem minimamente responsáveis teriam promovido audiências com diversos setores para ter uma ideia das consequências da venda das refinarias.

E não adianta dizer que não cabe ao Supremo analisar consequências, mas simplesmente implementar a Constituição. Eles revogaram a Constituição para permitir a privatização, sem analisar as consequências.

A malícia fica por conta do CADE (Conselho Administrativo de Direito Econômico) e de seu presidente Alexandre Cordeiro, autor da mais extravagante medida de todo esse processo confuso.

Cordeiro fez a Petrobras assinar um Termo de Ajustamente de Conduta (TAC), obrigando-se a vender suas refinarias. E os representantes da Petrobras – indicados pelo governo Bolsonaro – aceitaram a imposição. Nem mídia, nem Supremo, comentaram essa maluquice, de um burocrata público atropelar a Constituição e obrigar a maior empresa nacional a se desfazer de seus ativos. Quando a privatização atrasou um pouco, Cordeiro ameaçou a empresa com retaliações, sob silêncio total do Ministério Público, Supremo e imprensa. Cúmplices? Nâo, apenas a ignorância velha de guerra, marca principal de um país subdesenvolvido.

Pouco depois, Flávio Bolsonaro, o representante comercial da família deixou suas impressões digitais, lançando a candidatura de Alexandre ao Supremo, como alternativa ao candidato  terrivelmente evangélico. O que comprova que no Brasil tudo se vende, até a indicação para o Supremo.

Movimento 2 – como se juntam os amigos para aproveitar os grandes negócios

Aprofundando um pouco a história sobre os compradores, ficará mais fácil entender esse enredo e a parceria de Flávio Bolsonaro com Alexandre Cordeiro.

Personagem 1 – o empresário especializado em fakenews

No artigo “Xadrez de como Braga Netto tentou operação Davati quando interventor no Rio” mostramos o envolvimento de Bolsonaro e grupos militares com ONGs ligadas a pastores, em geral residentes no estado da Flórida.

Nosso personagem central, e menos conhecido, é o empresário Alcir Mendonça, madeireiro de Santa Catarina, dono de  um banco especializado em reflorestamento e cerca de 85 mil ha em eucaliptos. 

Tem uma empresa na Flórida, a Synaption LLC, pessoa jurídica de direito privado, registrada no Estado da Flórida, Estados Unidos da América, sob o número L 17000169331, com endereço a 905 Brickell Bay Drive, Suite 2-CL-23, Miami, FL. US 33131. No registro, aparece como proprietário Claudio Roberto Meinhart, brasileiro, divorciado, empresário, portador do RG nº 3673363-6 SSP-SC, cadastrado no CPF/MF sob o nº 206.721.280-04, morador de Florianópolis

Em 2016, a empresa anunciou um sistema de buscas considerado inovador pelo Yahoo Finance. Segundo circulou na época, seria a única empresa ocidental a prover um serviço de buscas para o público chines e para o PokemonGo. Especulou-se, na época, que seria adquirido pelo Google, o que pode ter sido uma jogada de marketing do grupo.  

Ainda há um site da empresa, aparentemente desativado, com menção às diversas reportagens publicadas, quando o sistema foi anunciado e a diversos serviços de busca – um dos quais, sobre direitos humanos, vasculhando os sites das principais organizações globais de defesa dos direitos humanos.

Com o tempo, parece ter encontrado outra serventia para seu buscador.. Em vez do superbuscador, a empresa se tornou uma das grandes impulsionadoras de fakenews nas redes sociais, inclusive com sistemas capazes de avaliar o impacto de cada notícia distribuída. 

Por sua vez, a empresa trabalha com um escritório de advocacia que faz parte da Câmara Americana de Comércio, a Law Offices of Kravitz & Guerra PA, estreitamente ligada aos Bolsonaro.

Personagem 2 – o jiu- jitsu

Alcir Mendonça conhecia Bolsonaro. E apresentou-o ao lutador Renzo Gracie, da histórica família Gracie. Foram a corda e a caçamba.

Imediatamente tornaram-se irmãos de fé.

Renzo tornou-se um bolsominion de carteirinha. Ameaçou bater no presidente francês Emmanuel Macron de “palhaço” , com  ” pescoço de franga”, chamou a esposa do presidente de “dragão”. E, pelos serviços prestados, tornou-se embaixador do turismo brasileiro, a convite do Ministro do Turismo Gilson Machado, o sanfoneiro triste que participa das lives de Bolsonaro.

Personagem 3 – o sheik árabe

No início dos anos 90, um dos lutadores da academia Gracie, Nelson Monteiro, dono da primeira academia de jiu-jitsu na costa oeste americana, deu aulas para Mohamed bin Zayed, um dos 16 herdeiros do xeque fundador de Abu Dahbi.

O príncipe obteve a faixa azul, mas queria ser faixa preta. Então convidou Nelson a se mudar para os Emiradosi. Graças ao jiu-jisti o príncipe, que se considerava fraco e vulnerável, ganhou confiança. Gostou tanto da história que tornou o jiu-jitsi obrigatório em Abu Dahbi, e Monteiro se tornou dono de uma rede de academias no país.

A partir daí estava montada a ponte bolsonarista nos Emirados: o embaixador do turismo brasileiro e o príncipe.

É interessante entender a natureza dos fundos de Abu Dhabi. Há dois tipos de fundo: o public e o private. O private é de propriedade pessoal do príncipe Zayed. Toda negociação é feita diretamente com ele. Foi esse fundo, de nome Mubala Capital,  que adquiriu a refinaria.

Logo depois da venda, Bolsonaro levou uma comitiva a Dubai e se encontrou pessoalmente com o príncipe,. presenteando-o com uma camisa do Flamengo.

Foi um sintonia de negócio tão perfeita, que o próprio Eduardo Bolsonaro se sentiu um sheik árabe.

Peça 7 – os negócios árabes

A refinaria é apenas o pontapé inicial da montagem de uma ampla rede de negócios, consolidando a economia bolsonarista no país.

O empresário Alcir Mendonça especializou-se em papéis do agronegócio, através da lei 13.978, de dezembro de 2019, e 14;140 deste ano que, através do Fiagro (Fundo Imobiliário do Agronegócio) pode transformar fazendas em fundos.

Com a parceria com o sheik, os Emirados poderão se tornar a maior potência do agronegócio brasileiro.

Além disso, Mendonça é um dos grandes patrocinadores do Flamengo. Montou o Banco da Nação Flamenguista, associado ao BRB, de Brasília, que já tem mais de 2 milhões de clientes. Tentou um IPO de R $1,5 bilhão, mas adiado em função da piora nas condições do mercado.

Aliás, por aí  é possível entender a postura bolsonarista do presidente do Flamengo, Rodolfo Landim, um ex-funcionário da Petrobras que deixou a empresa para trabalhar com Eike Baptista, com a suspeita de que levou segredos do pré-sal com ele. Aparentemente, era boato, já que Eike furou os poços errados e quebrou e Landim saiu antes do barco afundar.

Como já dizia Noel Rosa, em "Quem dá mais”

Quanto é que vai ganhar o leiloeiro

Que é também brasileiro

E em três lotes vendeu o Brasil inteiro?

Quem dá mais?

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