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PEC do Plasma é aprovada pela CCJ do Senado, e agora segue para o plenário


Presidenta da Sociedade Brasileira de Bioética, Elda Bussomguer alerta para problemas jurídicos, éticos e de soberania nacional na PEC

Publicado: 05/10/2023

Uma das preocupações é de que o sangue será o início da venda de mais órgãos do corpo humano e o acesso de empresas ao patrimônio genético brasileiro. Foto: Portal Brasil (brasil.gov.br)

Do GGN

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado tratou nesta quarta-feira (4) da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/2022, que estabelece regras para coleta, processamento e comercialização de plasma humano. A proposta foi aprovada por 15 votos a 11 pelos senadores.  

A PEC 10 é de autoria do senador Nelsinho Trad (PSD-MS). Senadores como Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), Augusta Brito (PT-CE) e Mara Gabrilli (PSDB-SP) foram enfáticos ao chamar a PEC de “vampirismo do mercado”.

Chamada PEC do Plasma, a intenção dos parlamentares que a propõem é a de permitir a venda de sangue, sublimando os princípios constitucionais da solidariedade e da proteção ao patrimônio genético, além de autorizar que empresas privadas produzam e comercializem “hemoderivados”. 

A PEC pretende alterar o § 4º do art. 199 da Constituição Federal, que orienta sobre as condições e os requisitos para a coleta e o processamento de sangue. Enquanto PEC, a iniciativa não pode ser vetada pelo presidente da República, como é o caso de um Projeto de Lei.

Relatora defende comércio

Relatora da PEC, a senadora Danielle Ribeiro (PSD-PB) frisou que é cristã, contra o aborto e acredita que a proposta defende a vida e quebra o monopólio da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás), vinculada ao Ministério da Saúde. Tratou as críticas à PEC como narrativas.

Em nota, a Frente Pela Vida entende que ao autorizar a comercialização de sangue humano, “está-se abrindo uma janela à comercialização de tecidos humanos, o que foi proibido na Constituição Cidadã, aprovada em 1988”.

Conforme a nota divulgada pela Frente, “em um tempo passado e sombrio, a crise econômica, desemprego e fome, fazia com que pessoas em absoluto estado de pobreza, vendessem o sangue para aplacar a miséria econômica, reforçando uma outra miséria, a humana”. 

Mercado voraz

A presidenta da Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), Elda Coelho de Azevedo Bussomguer, entende que a PEC do Plasma apresenta problemas jurídicos, éticos, de dignidade humana e de soberania nacional. Elda é também doutora em bioética e coordenadora do doutorado em Direito da Faculdade de Direito de Vitória.  

“O mercado da saúde é um mercado voraz. Um mercado insaciável. Esse mercado é o mais lucrativo do mundo. Não tem um mercado mais lucrativo. Sequer uma indústria é mais lucrativa, nem a das armas”, diz a presidenta da SBB. O mercado a que Elda se refere é complexo, partindo de laboratórios e chegando à indústria da saúde. 

Desde a Constituinte de 1987 e 1988, explica Elda, esse setor tenta transformar em commodity o plasma sanguíneo e acredita que a intenção não é parar por aí, mas avançar para a comercialização de órgãos humanos. Os defensores da PEC, por sua vez, apontam sua necessidade por escassez de sangue para salvar vidas. 

“Não temos problemas de doação de sangue ou de órgãos ou de perda de sangue doado. Isso não existe. O problema, quando se expressa, está restrito em fazer mais campanhas de doação, por exemplo. Há países com campanhas enormes, permanentes. A questão dessa PEC é que o plasma sanguíneo não gera lucro para esse mercado”, analisa. 

Como a PEC pretende abrir essa frente, o mercado da saúde, explica Elda, passa a incutir na opinião pública, no imaginário social, usando notícias falsas, que há problemas, riscos, avançando ao discurso para o Estado afirmando que ele não consegue contemplar as demandas.   

O senador Humberto Costa (PT-PE) citou na sessão da CCJ a mobilização que já existe no mercado para a abertura do comércio de sangue no Brasil. “Tem empresa (sem citar o nome) que se expandiu, comprou quatro laboratórios nos Estados Unidos, 22% de uma empresa de hemoderivados da França e só está esperando a abertura aqui”, afirma.

Corpo humano como mercadoria 

O corpo humano não pode se transformar em mercadoria, define a presidenta da SBB. “Não podemos transformar o corpo humano em mercadoria. Plasma é parte do corpo humano. A Constituição Federal está baseada no princípio da solidariedade. As pessoas doam sangue porque ele não é uma mercadoria”, diz.  

Em um país com índices de desigualdades dos mais altos do mundo, a possibilidade de venda de sangue coloca as pessoas mais vulneráveis como os principais alvos da venda de parte do próprio corpo. Entre os mais pobres, está presente de forma majoritária a população negra.  

Ocorre que esse sangue irá servir aos mais ricos, com recursos para pagar pelo “produto”, enquanto os mais pobres dependerão da compra de sangue feita pelo Estado – gasto adicional hoje não estabelecido no orçamento da União pelo Ministério da Saúde. 

“É claro que os mais pobres vão vender o sangue porque precisam de comida, e os ricos vão ter sempre acesso ao sangue que estará nas mãos de poucos. O mercado irá vender a preço de outro para o governo. As empresas vão comprar esse sangue, mas esse comércio não está restrito a isso”, explica. 

Para o senador Jaques Wagner (PT-BA), o que acabará acontecendo é que o plasma brasileiro servirá para atender ao mercado internacional. “Os países ricos terão condições de comprar esse sangue brasileiro, e serão para eles que esse mercado existirá. Suíços, alemães, franceses, ingleses, americanos, serão eles”, destaca.

Patrimônio genético 

Ter acesso ao plasma sanguíneo em larga escala é ter acesso ao patrimônio genético do Brasil, que envolve os povos indígenas, por exemplo, cujo sangue é altamente ambicionado por multinacionais. 

Ela lembra que a Constituição Federal protege o patrimônio genético em suas determinações. Nesse caso, a PEC do Plasma também fere a carta constitucional ao tentar mudar o que o constituinte originário definiu. “O patrimônio genético é nosso, não podemos colocar na mão do mercado. É a proteção de nossos dados, fere o artigo 5 (da Constituição) de cima abaixo”, alerta. 

Empresas de biotecnologia, por exemplo, afirma a presidenta da SBB, têm interesse nesse mercado por razões diferentes de outras empresas e multinacionais, ou que o simples ato de vender sangue para hospitais e governo. 

“É um mercado complexo, dinâmico, voraz. Se passa a venda do plasma, logo passa a venda de órgãos. O Brasil é o país com os melhores índices de doação no mundo. Temos um sistema eficiente. Isso deve ser feito com campanhas e recursos, não com a mercantilização do corpo humano”, encerra.  

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