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O cenário econômico não é o problema central da crise brasileira


O professor Francisco Maria Cavalcanti de Oliveira, mais conhecido como Chico de Oliveira, concedeu a entrevista a seguir ao Garra, quando fez uma análise do ano de 2015 e falou sobre política, economia e o cenário atual

Publicado: 28/12/2015

Ascom Sindsep-PE

O professor Francisco Maria Cavalcanti de Oliveira, mais conhecido como Chico de Oliveira, é um sociólogo pernambucano, reconhecido como um dos maiores sociólogos brasileiros. Ex-funcionário da Sudene, é professor aposentado de Sociologia da Universidade de São Paulo (USP), e um dos fundadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e coordenador-executivo do Centro de Estudos dos Direitos da Cidadania (Cenedic). Foi fundador do PT – partido que se se desfiliou em 2003 – e agora é filiado ao PSoL. Entre suas principais obras destacam-se a Hegemonia às avessas: economia, política e cultura na era da servidão financeira, A economia brasileira: crítica à razão dualista, Os direitos do antivalor, Os sentidos da democracia e Crítica à razão dualista/O ornitorrinco. Esse último livro lhe concedeu o prêmio Jabuti, na categoria Ciências Humanas, em 2004. Apesar de recifense, Chico de Oliveira mora em São Paulo, e, em uma de suas passagens pelo Recife, concedeu a entrevista a seguir ao Garra, quando fez uma análise do ano de 2015 e falou sobre política, economia e o cenário atual.  

GARRA - Qual a sua impressão sobre o conturbado cenário brasileiro de 2015?

FRANCISCO DE OLIVEIRA - Dizem que o ano de 2015 é uma virada na história brasileira. Mas isso é uma grande barbaridade. Temos uma crise política. E a maior parte das crises decorre de uma espécie de luta pelo espólio do poder. E é isso que aconteceu em 2015. Os tucanos, que são a principal força de oposição, não têm um candidato que aproveite a atual debilidade da presidenta Dilma Roussef, que irá se prolongar até o fim do seu mandato, e insistem em desgastar o seu governo.  Quanto a crise econômica brasileira... Ela não é grave. O Brasil tem se saído razoavelmente bem levando em consideração a crise econômica internacional. Mantivemos taxas de crescimento ainda muito robustas para uma economia periférica. Temos uma inflação bem menor que tivemos no passado. Já tivemos inflação de 300% e hoje temos 8%. Isso é brincadeira de criança. Dilma irá controlar a crise e terminará o seu mandato. Em geral, a economia não vai mal. Há pouco tempo, o Brasil cresceu bastante, enquanto outras economias patinavam. De modo que o cenário econômico não é o problema central da crise brasileira. O problema central é o político. A hegemonia do PT, em 16 anos de mandato, não é tolerada. Não é bem-quista.

GARRA - Como o senhor vê o crescimento das forças de direita no país?

CHICO DE OLIVEIRA - É uma lástima que hoje o PSDB seja a maior força de direita no país. Uma lástima porque o PSDB foi criado como um partido com uma missão democrática e cumpriu esse papel na sua origem. Mas o partido tendeu a tomar posições anti-petistas, o que acabou fazendo com que defendesse ideias de direita. Pelo conflito com o PT, virou um partido de direita. Lamentável que uma personalidade como Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República, represente a direita no Brasil e esteja falando em renúncia da presidente, tomando ares de golpista. Tomando posições que não o honram. A velha canalha golpista brasileira. Lamentável.

GARRA - O que acha do surgimento de partidos como a Rede de Sustentabilidade que querem passar a imagem de distanciamento da política?

CHICO DE OLIVEIRA - Esquece. Isso não existe. Marina Silva tentou passar uma imagem de uma pessoa à parte da política. Mas ficou tão à parte que não é mais da política. Ela pode ter qualidades pessoais, mas politicamente é zero. Não tem nada a dizer ao povo. Foi bem votada nas últimas eleições, mas não voltará a ser. Nas próximas eleições, se ela tiver a má ideia de voltar a se candidatar, terá apenas uns dois milhões de votos.

GARRA - Alguns partidos e políticos tentam passar a imagem do novo. Em Pernambuco, por exemplo, tivemos o exemplo de Eduardo Campos. Ele foi candidato a presidente vendendo a imagem de que iria implementar um novo modo de fazer política. O que o senhor acha disso?

CHICO DE OLIVEIRA - Eduardo Campos tinha traquejo político e conseguiu passar a impressão de que tinha algo novo a dizer. Mas não tinha. Infelizmente ele não está mais aqui.  Mas se tivesse estaria dizendo coisas muito parecidas com que dizem os outros políticos. Não tem nada novo na política. Quem quiser inventar que existe algo novo na política está mentindo. A política é a política. Formada por conflitos travados no terreno institucional. Quem foge desse modelo ou vai pra revolução de extrema esquerda ou revolução de extrema direita.

GARRA - Qual a sua opinião a respeito do atual Congresso Nacional?

CHICO DE OLIVEIRA - Acho um tremendo retrocesso. Mas é parecido com os demais Congressos. Muito raro você ter um parlamento que expresse a renovação. É o sinal que a burguesia detém muito poder. Consegue passar esse poder para o Legislativo.

GARRA - Como a burguesia consegue controlar o Congresso?

CHICO DE OLIVEIRA - Ora... vá atrás de cada parlamentar e procure saber quem financiou suas  campanhas.

GARRA - O fim do financiamento privado de campanha irá minimizar essa situação?

CHICO DE OLIVEIRA - A burguesia irá encontrar formas subterrâneas de continuar exercendo o mesmo poder.

GARRA - O senhor vê uma nova reunião das forças de esquerda no Brasil?

CHICO DE OLIVEIRA - Não. É o mesmo de sempre. Não tem nenhuma novidade. Não funciona porque é muito fracionada. Não pode ter frente com “800” partidos.

GARRA - Mas como a direita consegue se unir e a esquerda não?

CHICO DE OLIVEIRA - Eles são mais consistentes. Têm ideia erradas, mas têm consistência ideológica. A maior parte das ideias é canalhice. Mas eles têm mais consistência ideológica que a esquerda. A esquerda não concorda com duas ideias.

GARRA - Não há um novo caminho que a esquerda pode trilhar?

CHICO DE OLIVEIRA - Acho que a esquerda tem que continuar defendendo as suas antigas bandeiras: distribuição de renda, equidade, justiça social, salários acima da inflação... São ideias justas.

GARRA - Qual seria a melhor alternativa para o Brasil de hoje continuar avançando?

CHICO DE OLIVEIRA - Uma força de esquerda. Mas não tem essa força. O processo de avanço, se é que vai haver, será aos trancos e barrancos. 

GARRA - O que o senhor espera das eleições de 2018?

CHICO DE OLIVEIRA - É mais ou menos visível. O Lula irá se candidatar. Se não se desgastar muito, será eleito. E teremos mais um mandato sem reformas profundas e estruturais. Continuaremos no tatibitati. Lula está em desgaste e em declínio. Não será mais o político que foi. Mas não surgiu nenhuma outra liderança de esquerda no Brasil e será difícil surgir.

GARRA - Partidos de direita afirmam que o ciclo do PT está esgotado. O que o senhor acha dessa afirmação?

CHICO DE OLIVEIRA - Não digo que o ciclo terminou, mas se esgotou bastante. O exercício do poder desgasta. Um governante tem que tomar medidas. Tem que sair da retórica para a ação. E não existe uma linha direta e muito coerente quando se sai do discurso para a ação. Você tem que tomar medidas amargas.

Garra - E quanto a Ciro Gomes?

CHICO DE OLIVEIRA - Fora de questão. Um político vulgar que se projetou porque foi governador do Ceará. Mas não é nada.

GARRA - O que acha do papel da mídia brasileira?

CHICO DE OLIVEIRA - Os meios de comunicação são sempre de direita. E boa parte do que os brasileiros pensam é o que eles veem e leem. A imprensa brasileira não gosta de Lula e bate e rebate muito nele. Algumas vezes com razão.

GARRA - O que o senhor acha da classe média brasileira?

CHICO DE OLIVEIRA - Classe média é um conceito muito fluo. A sociologia não usa porque ela é composta de várias outras classes. Mas é uma parcela da sociedade sempre insatisfeita. E isso é uma constante na história. É uma classe que vai mudando. Vai ficando mais rica. Conquistando mais benesses e querendo cada vez mais. Tem um papel importante na política. Se a classe média fosse passiva e muda, talvez não tivéssemos algumas das grandes conquistas brasileiras. Agora essa classe está em uma situação difícil porque está muito bem economicamente, mas, como sempre, insatisfeita politicamente. E continuará sempre insatisfeita porque não há como satisfazê-la. Ela tem um apetite gigante.

GARRA - A classe média quer ser elite?

CHICO DE OLIVEIRA - Todos querem subir de classe. É natural.

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