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A retrospectiva do atraso


Em 2015, o Brasil andou na contramão do mundo, tendo o Congresso Nacional como a força motriz desse retrocesso

Publicado: 21/12/2015

O ano de 2015 encerra com um saldo negativo. Não por uma crise econômica que tomou conta do mudo desde 2008 e que chegou ao Brasil com força esse ano. O retrocesso é político e ético, fruto de um Congresso Nacional conservador e fundamentalista. O que tinha de pior do ponto de vista de conquistas no campo dos direitos humanos foi seriamente atingido por um parlamento que desengavetou as pautas mais retrógradas que tramitavam, algumas delas, há décadas. Esse ano de 2015, foi o ano em que a direita saiu do armário e tentou um golpe à democracia, aprovando, em novembro, o pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Mas 2015 foi também o ano em que os movimentos sociais voltaram a se organizar e ocuparas ruas para combater esse atraso e lutar pelo Estado Democrático de Direito. Nessa segunda parte da Revista GARRA, faremos um panorama do ano, uma entrevista com o sociólogo Chico de Oliveira e uma análise da atuação da CUT, da Condsef e do Sindsep-PE.

Ascom Sindsep-PE

O RETROCESSO DE UM PAÍS. Assim pode ser resumido o ano de 2015. O Brasil andou na contramão do mundo, tendo o Congresso Nacional como a força motriz desse retrocesso. Ficará na história como o ano em que a Câmara dos Deputados, sob o comando do presidente da Casa, Edu m ardo Cunha (PMDB-RJ), desengavetou as pautas mais retrógradas, sem falar no fundamentalismo religioso que reinou na Câmara, atingindo frontalmente a Constituição Federal de 1998, que define o Brasil como um Estado laico.

O ápice do retrocesso se deu no início de dezembro, quando Cunha - ao se vingar do PT por o partido não ter cedido às chantagens do peemedebista que barganhava o apoio dos deputados petistas na Comissão de Ética da Câmara para salvar sua própria cassação -, aceitou o pedido de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff, de autoria dos juristas Hélio Bicudo, Miguel Rele Júnior e da advogada Janaína Paschoal. Um acinte à democracia e uma clara tentativa de golpe.

No decorrer de 2015, foram várias as violações aos Direitos Humanos. A intolerância e ódio compuseram o cenário do parlamento brasileiro e que promete continuar ainda por mais algum tempo. Isso porque as urnas de 2014 elegeram para o Legislativo federal o que há de pior na política do país, garantindo o mandato por quatro anos do Congresso mais reacionário desde o golpe militar, em 1964. Uma guinada à direita sem precedentes. Além disso, o Legislativo trabalhou diuturnamente para atrapalhar e boicotar todas as ações de autoria do Poder Executivo, apostando no “quanto pior, melhor” e no golpismo.

Ao analisar o cenário brasileiro em 2015, o cientista político e professor da UFPE, Michel Zaidan, é enfático: “Ano legislativo de grandes retrocessos, de desagregação partidária, crise de governabilidade e cenário econômico desolador. Uma presidente sozinha, apunhalada a toda hora pela sua base parlamentar e sendo obrigada a adotar uma agenda que contraria sua base social.”

O PACOTE DE MALDADES COMEÇOU logo na eleição de Eduardo Cunha para presidente da Câmara dos Deputados, em janeiro de 2015, quando as forças mais conservadoras da Casa se juntaram para eleger o peemedebista, como forma de derrotar o Palácio do Planalto, que apoiava à época o nome Arlindo Chinaglia (PT) para o cargo. Um fundamentalista à frente da Câmara deu sobrevida ao chamado baixo clero e fortaleceu a bancada BBB – bíblia, boi e bala -, reunindo deputados evangélicos, latifundiários e os que têm ligação com a polícia e com militares. Foi essa turma, que soma 200 deputados (40% do total dos parlamentares), que 'tocou terror' na Câmara em 2015.

Não bastasse tudo isso, as urnas de 2014 asseguraram a hegemonia empresarial no parlamento, elegendo 221 representantes do setor, contra 51 da bancada sindical – na legislatura anterior eram 83. Além disso, foram excluídos dessa legislatura vários parlamentares ligados aos direitos humanos. Dos vários projetos nocivos à população e que coloca o país na rota do atraso, o primeiro a ser desengavetado foi o PL 4330/2004, que autoriza a terceirização em todos os níveis, inclusiva na atividade fim. A matéria representa a retirada de direitos históricos da classe trabalhadora, como férias, décimo terceiro e licença maternidade. Um verdadeiro acinte à Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Aprovado pelos deputados, o PL ainda tramita no Senado Federal.

Depois, Eduardo Cunha consegue dar um golpe e aprovar a PEC 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. “É preciso seguir na direção contrária de uma história fundada na violência, como é a do nosso país, e enfrentar a lógica do atual sistema de segurança em nome da liberdade e da igualdade de condições na infância e na adolescência. Em outras palavras, é preciso defender o direito à vida, pois o combate à criminalidade não produz resultado no isolamento do cárcere, e sim através de medidas sócio-educativas capazes de promover a garantia dos direitos fundamentais previstos na Constituição de 1988”, defende a advogada e mestranda em Serviço Social, Laís de Carvalho Lapa.

A VIOLAÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS SEGUE COM O ESTATUTO DA FAMÍLIA, aprovado em comissão especial, em setembro último. O PL 6583/13, de autoria do fundamentalista Anderson Ferreira, deputado pernambucano pelo PR, reconhece como entidade familiar a união entre um homem e uma mulher, não reconhecendo nenhum outro tipo de relação estável como família, nem mesmo de mães ou pais solteiros. Na sequência, Eduardo Cunha apresenta o PL 5069, que aumenta as restrições ao aborto, criando punições a quem prestar qualquer tipo orientação para mulheres que queiram interromper a gravidez, inclusive em caso de estupro.

No final de outubro, a bancada BBB volta a agir e aprova o texto-base de uma proposta que revoga o Estatuto do Desarmamento e reduz de 25 para 21 anos a idade mínima para a compra de revólveres e pistolas e amplia de três para dez anos o prazo para renovação do porte de arma, além de autorizar alguns setores profissionais que não trabalham com segurança pública a terem acesso à arma, inclusive os ruralistas, o que vai representar um verdadeiro derramamento de sangue no campo.

“Aqui, encontra-se, talvez, o maior dos retrocessos, a verdadeira legitimação, ou melhor, o patrocínio à violência e ao lobby da indústria de armamentos no Brasil. Retrocesso porque, de acordo com a análise de um dos principais criminólogos do país, Túlio Kahn, após a aprovação do Estatuto houve uma grande diminuição do número de armas em circulação e, consequentemente, uma queda significativa no número de homicídios no país. Por que, então, optar pela anulação dos efeitos positivos do Estatuto do Desarmamento? Afinal, esta escolha seria uma verdadeira apologia à morte, já que 70% delas são causadas por arma de fogo”, avalia Laís de Carvalho Lapa.

Além de autorizar os ruralistas a utilizarem armas de fogo, a bancada BBB conseguiu aprovar em comissão especial a PEC 215, que transfere do Executivo para o Legislativo a atribuição de homologar terras indígenas ou quilombolas, o que inviabiliza novas demarcações, num cenário de extermínio dos povos indígenas: em 2014, foram assassinados 138 de índios no Brasil.

“A aprovação da PEC 215 expressa, concretamente, o amparo legislativo à violação aos direitos indígenas e o ataque à própria Carta Magna de 1988 ao regularizar medidas como: competência exclusiva do Congresso Nacional para regulamentar a demarcação de terras indígenas, proibição da ampliação de terras já demarcadas, previsão mais elástica de indenização nos casos de demarcação, e impedimento do acesso à terra por aqueles que a ocuparam depois de 1988”, finaliza Laís Lapa.

O QUE PARECIA RUIM, CONSEGUIU PIORAR. No início de novembro, a comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou a PEC 99/11, que autoriza entidades religiosas a terem direito de ingressar com ações de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF), mais uma grande afronta à Constituição e ao Estado laico.

É com esse cenário retrógrado que o Brasil fecha 2015. Um quadro desolador, diante de um Congresso Nacional comandado por verdadeiros algozes da democracia e dos direitos humanos. Um Congresso que conseguiu paralisar os avanços que o país vinha galgando ao longo dos anos e que só contribuiu para acentuar uma crise econômica internacional, que só agora, depois de anos instalada no mundo inteiro, chegou ao Brasil. A conclusão é de que muito maior que econômica, a crise enfrentada pela país é política e, sobretudo, ética. Só nos resta reagir!

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