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Desafios da renovação qualitativa do Congresso


Publicado: 03/01/2018

Por Antônio Augusto de Queiroz

O senso comum imagina que a desqualificação da política e o desgaste dos congressistas, que votaram matérias impopulares e salvaram o presidente da República de 2 denúncias de corrupção, levará necessariamente a uma grande renovação do Congresso em 2018. Mas isto pode não se confirmar por uma série de motivos.

Antes de tratar desses motivos, lembremos que a média histórica de renovação, considerando as 7 últimas eleições para a Câmara dos Deputados foi de 49%. Parte importante dessa renovação decorre da desistência da tentativa de reeleição. Em média, pelo menos 100 dos 513 deputados não tentam renovar seus mandatos, seja por abandono da vida pública, seja para concorrer a outros cargos na disputa eleitoral, conforme tabela a seguir.

Em geral, o índice de renovação para as cadeiras em disputa para a Câmara dos Deputados está sempre associado ao ambiente político. Quando o ambiente é de crise, com escândalos, a renovação aumenta. Quando o ambiente é de relativa estabilidade, o desejo de mudança diminui. O índice de renovação também está associada ao número de candidatos à reeleição. Quanto mais parlamentares disputam a reeleição, menor o índice de renovação, pelas notórias vantagens que têm aqueles que disputam no exercício do mandato.

E por que em 2018 poderá ser diferente, com uma renovação menor que a média história? Basicamente pelas razões que seguem.

Em 1º lugar, neste pleito o número de candidatos à reeleição tende a ser maior que a média histórica, especialmente pela necessidade de fórum privilegiado para fugir de eventuais punições pela prática do crime de caixa 2 e outros crimes nas campanhas anteriores.

Em 2º lugar, porque a janela para mudança de partidos nos 6 meses que antecedem à eleição dá ao detentor de mandato e candidato à reeleição enorme vantagem para negociar tratamento privilegiado em seu partido, exigindo a garantia de espaço diferenciado no horário de rádio e TV, além de mais recursos do fundo eleitoral, sob pena de mudar para outro partido que lhe ofereça tais vantagens.

Em 3º porque houve redução de 90 para 45 dias do tempo de campanha eleitoral, facilitando a vida dos candidatos à reeleição, que tem nome conhecido e serviços prestados, em detrimento dos novos postulantes.

E, em 4º, porque o detentor de mandato dispõe de uma série de outras vantagens comparativas em relação a quem aspirar ocupar seu lugar, conforme segue:

1) disputa o mandato no exercício do mandato;

2) tem bases eleitorais consolidadas;

3) tem cabos eleitorais fidelizados;

4) dispõe de recursos e meios para angariar apoio, como:

4.1) as emendas individuais, cujo valor anual supera R$ 14,7 milhões (valores para 2018);

4.2) a quota ou verba de gabinete entre R$ 30 e R$ 38 mil por mês para despesas diversas do mandato, como passagens áreas, telefonia e material de expediente, consultoria, hospedagem, impressão de material, combustível, locação de veículos e aluguéis de escritórios políticos, etc;

4.3) verba de R$ 78 mil mensais para a contratação de pessoal no gabinete e no Estado de origem; e

4.4) poder, prestígio e acesso aos veículos de comunicação, muitas vezes por interesse dos próprios veículos em manter boa relação com os detentores de mandatos.

O desgaste dos atuais detentores de mandato certamente irá diminuir o número de votos, mas não terá o condão de evitar a reeleição. É que os pequenos partidos que surgem com perspectiva de renovação, se não fizerem coligações, dificilmente conseguirão atingir a cláusula de barreira.

E também haverá aumento dos votos brancos e nulos, reduzindo o número de votos necessários para ocupar uma vaga, desde que o partido ou coligação atinja o quociente eleitoral.

O que tende a acontecer – e mesmo assim em menor escala – não será uma renovação real, mas a mera circulação no poder, com a substituição de representantes de uma oligarquia local por outra. Ou seja, quem não conseguir se reeleger terá sua vaga ocupada, majoritariamente, por ex-prefeitos, ex-governadores, ex-deputados estaduais, ex-secretários, ex-ministros, etc.

No caso dos setores populares, é fundamental que haja uma articulação em nível estadual e nacional, de tal modo que unam esforços para ampliar sua representação no Congresso, sob pena de ampliação dos retrocessos, com a eleição de um Congresso mais conservador que o atual.

Para tanto, é indispensável que os movimentos sociais, os trabalhadores do setor privado e os servidores públicos priorizem candidaturas e concentrem votos nelas, além de os partidos do campo popular só fazerem coligação na eleição proporcional onde houver identidade programática, sob pena de acontecer o que ocorreu em 2014, quando a esquerda ajudou a eleger dezenas de deputados de partidos contrários ao seu ideário.

Como haverá grande escassez de recursos, é preciso que haja criatividade e emprego da solidariedade de classe, potencializando o financiamento eleitoral coletivo, principalmente mediante a vaquinha online (crowgunding) por meio da internet e também a comercialização de bens e serviços e a promoção de eventos de arrecadação, conforme autoriza a legislação eleitoral.

Portanto, se não houver unidade do campo popular e democrático os riscos de retrocesso são enorme, inclusive com a ameaça de redução das atuais bancadas dos partidos de campo da esquerda. Por isso a importância de não fazer coligação, nas eleições proporcionais, com partidos sem unidade programática, para evitar transferir votos da esquerda para as forças liberais e de centro-direita; não pulverizar os votos e apoiar os candidatos comprometidos com os interesse dos trabalhadores; e denunciar todos aqueles que votaram contra os interesses dos assalariados, bem como chamar a atenção para o tipo de projeto que os candidatos liberais defendem, como forma de evitar a ampliação da presença do capital no Congresso.

Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, consultor, analista político e diretor de Documentação do Diap



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