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2013: as selfies revolucionárias horizontais e apolíticas


Publicado: 30/05/2017

Por Fernando Horta

Do Jornal GGN

É indiscutível que a compreensão da situação brasileira atual passa pelo entendimento sobre o que, de fato, aconteceu em 2013. Em março de 2013 a aprovação de Dilma era de 79%, em junho era de pouco mais de 30%. Saliente-se que em 2013 não houve deterioração efetiva de nenhuma variável econômica. Apenas blogs de economistas da direita ventilavam “explicações” sobre a “contabilidade criativa”, dando o tom dos termos que viriam a serem usados contra o Brasil quase 3 anos depois. Em junho de 2013, Dilma sofreu um intenso ataque midiático e não teve presteza para se defender.

Para mim, 2013 é a maior prova de que o pós-modernismo nada tem a oferecer como ferramenta de luta contra um capitalismo financeiro transnacional aliado à onipresença das redes sociais e comunicação imediata. Os protestos de 2013, dizem, tinham uma pauta centrada no transporte público urbano. Deveria se esperar que os ataques danificassem os índices de aprovação dos governos municipais e talvez estaduais. Ressalte-se que em abril, antes dos protestos portanto, Dilma cortava impostos federais sobre o combustível e aumentava o percentual de álcool e em outubro, Dilma novamente mexia na política de preços dos combustíveis para oferecer margem aos municípios na negociação da questão do transporte.

O primeiro ponto a ser mencionado é que, sobre as “jornadas de junho” de 2013, as narrativas da direita e da esquerda são impressionantemente semelhantes. Ambas reivindicam protestos “apartidários”, “sem lideranças”, espontâneos e com uma pauta baseada “nos interesses reais da população”. É o mito do manifestante “empoderado e livre”, fazendo política epidérmica e se relacionando com seus “iguais” na base do sentimento comum. A forma como a direita (e extrema direita) e uma parte da esquerda defendem esta mitificação é muito semelhante. Ambos acharam motivos para atacar o governo Dilma: a direita por ser um governo comunista e parte da esquerda por ser um governo de corte neoliberal. A síntese desta pós-verdade fez com que estes dois grupos de “pensadores-manifestantes” fossem às ruas protestar pelas passagens (uma pauta eminentemente municipal) e terminassem encurralando o governo federal.

De quebra, estas “jornadas” criaram o mito dos “Black Blocs” como um grupo de arruaceiros sem razão nem qualquer sentido político. Destruíram a vida de algumas pessoas (Elisa Quadros, a “sininho”, por exemplo) e mostraram que havia um bom espaço para manipulação política no Brasil, desde que as senhas corretas fossem dadas. Este espaço foi visto pela esquerda “anti-PT” como uma forma de finalmente tentar aparecer e pela direita “anti-PT” também como uma forma de finalmente tentar aparecer. (A repetição é proposital estilisticamente).

Nunca se investigou mais a fundo nem a participação de partidos e políticos de esquerda e direita no financiamento e organização das manifestações, nem tais políticos deixaram seus nomes serem mencionados nestes contextos. Afinal, protesto sem liderança, mas com “apoio” do partido A e do deputado X não é bem “horizontal”. E todos deixaram a imprensa satanizar grupos de jovens mascarados que, até hoje, são para-raios de todo alegado “vandalismo” no Brasil.

O que aconteceu de fato, e existem inúmeros testemunhos e evidências disto, é que a tese do “apartidário” virou “apolítico” e um protesto sem bandeiras é como uma folha em branco em que a mídia legenda o que quiser para fazer-se entender pela população brasileira. A violência empregada pelos “organizadores” da manifestação “horizontal”, no sentido de coibir “símbolos de partidos” foi parte evidente da estratégia proto-fascista dos financiadores dos movimentos. Pessoas dedicadas 24 horas por dia nas redes sociais a levantar o maior número de manifestantes. Algumas destas pessoas hoje têm cargos de confiança de em partidos e governos de direita.

Enquanto uma parte da esquerda se via “liberta” de líderes e “pautas” de partidos e acreditava no mito da horizontalidade, independência e espontaneidade, o movimento era vitaminado e capturado pela direita e pelos órgãos de mídia em todo o Brasil. Direcionando as hordas de manifestantes sem pauta ao ataque e defesa de pautas difusas como “contra a corrupção”, “não vai ter copa” ou “saúde e educação padrão FIFA”. Sem organização, acreditando numa estética do manifestante empoderado uma parte da esquerda foi totalmente manipulada e, até hoje, se nega a perceber isto. Nem mesmo o bordão “não é só pelos 0,20 centavos” é criação “popular”.

Não apenas os governos municipais e estaduais nada ou muito pouco sofreram com os protestos cuja pauta deveria ser o transporte público, como logo após este “experimento social” são deslocados para o Brasil recursos internacionais para formar “libertários” e “treinar jovens lideranças”. O potencial de zumbis políticos no Brasil se mostrava imenso. Quando a esquerda de fato, finalmente se deu conta do que acontecia, e mobilizou as bases para retomar a direção dos protestos, a mídia entrou com a narrativa dos “vândalos” e terminou o experimento sócio-político de 2013. Nenhum efeito prático no transporte urbano perdurou. Em algumas cidades os aumentos foram postergados em oito meses. Nada mais.

2013 mostrava três coisas importantes (1) que redes sociais, dinheiro e mídia eram capazes de mobilizações de massa de direita; (2) que o governo brasileiro e as instituições estavam (e ainda estão) incapazes de mapear e coibir a entrada de recursos para desestabilização política centrada nos “think tanks” e que (3) o narcisismo de manifestantes de esquerda do século XXI (e seus celulares sélficos) era semelhante ao narcisismo de manifestantes de direita e, portanto, tudo virava o mesmo caldo que seria arremessado (quente) quando e onde os patrocinadores desejassem.

Nos protestos da semana passada no RJ, parte da “esquerda” voltou a usar a mesma lenga-lenga, vaiando lideranças políticas e exigindo um protesto “sem bandeiras”. Parece que não aprenderam e continuam a fazer as mesmas bobagens, talvez pensando que ganharão algo com isto. As eleições na França mostraram bem o resultado da falta de capacidade de compreensão do seu espaço desta esquerda contra-majoritária. Um segundo turno entre Le Pen e Macron podendo ambos terem sido vencidos pela soma dos percentuais dos dois candidatos de esquerda, alijados por picuinhas internas. Não deixem repetir-se 2013. O ano zero do golpe de 2016.



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